Vamos fazer um passeio juntos. Vamos entender o que ocorre no mundo. Como é comum em países emergentes e pobres, na Índia parte dos burocratas vive no mundo do faz de conta. Pelos cálculos oficiais da companhia de saneamento de Nova Délhi, apenas 12% do suprimento de água da capital da Índia vem do subsolo. Na realidade, porém, estima-se que pelo menos metade de toda água consumida na cidade, de quase 17 milhões de habitantes, tenha origem nos lençóis subterrâneos, grande parte deles contaminada pelo esgoto. O rio Yamuna, o poluído afluente do Ganges que abastece a capital, costuma ter um bom fluxo de água somente durante os três meses de chuvas. No resto do tempo, impera a escassez. Nos meses mais secos, a disponibilidade de água num raio de 100 quilômetros da capital é de 26 litros por pessoa por dia (o recomendável são 100 litros por pessoa por dia, volume que equivale a menos de uma banheira cheia). Estima-se que o volume deva cair para menos de 5 litros até 2050. O que ocorre em Nova Délhi é um exemplo dos desafios do abastecimento de água nas maiores metrópoles mundiais. Em menos de 15 anos, a demanda por água nas grandes cidades deve aumentar 40%, segundo cálculos da consultoria americana McKinsey. Será necessário buscar, sabe-se lá onde, quase 80 bilhões de metros cúbicos a mais, o equivalente a 20 vezes o consumo atual da cidade de Nova York.
Hoje, mais da metade dos habitantes do planeta já vive nas cidades. Esse número deverá aumentar para quase 60% da população mundial em 2025, com um agravante. Levando- se em conta o crescimento populacional nos centros urbanos mais a migração vinda do campo, as metrópoles receberão 1 bilhão de novos habitantes nos próximos 13 anos. Quase todas as cidades em que o consumo de água deve crescer acentuadamente ficam em países emergentes. "Não vamos solucionar esse problema sem gastar tempo, vontade política e muito dinheiro", diz Rob McDonald, pesquisador da ONG americana The Nature Conservancy. Atualmente, pelas contas de pesquisadores da Universidade da Cidade de Nova York, quase 900 milhões de pessoas vivem em cidades onde falta água em algum momento do ano. Ou seja, durante pelo menos um mês do ano, a disponibilidade é inferior a 100 litros por pessoa por dia.
Escassez pelo mundo.
No Brasil, onde estão 12% da água doce mundial, menos da metade dos 5 565 municípios tem abastecimento considerado satisfatório. Para não arriscar ficar sem água nos próximos três anos, a outra metade precisa investir na ampliação dos sistemas de captação ou encontrar novos mananciais. "Há um descompasso entre o crescimento urbano, com a expansão das favelas e dos bairros de periferia, e a velocidade com que se constrói infraestrutura de tratamento de água e saneamento", afirma Glauco Kimura de Freitas, coordenador do programa de água doce da ONG WWF Brasil. Se a questão do abastecimento de água se resumisse à quantidade, já seria gravíssima. Mas somam-se as dificuldades relacionadas à qualidade. Na China, por exemplo, o Ministério dos Recursos Hídricos já admite que mais de 70% de toda a água da superfície do país — e 74% da subterrânea — está poluída. Ou seja, é preciso ser tratada para ser consumida. "É triste perceber que problemas de poluição semelhantes aos que assolam as cidades chinesas, onde há contaminação por mercúrio, já aconteceram em outros lugares antes e são extremamente conhecidos. Mesmo assim, não foram evitados", diz Darrin Magee, diretor do Centro de Estudos Ambientais Asiáticos da faculdade Hobart and William Smith, de Nova York.
A inabilidade dos gestores públicos em lidar com a questão da água é generalizada, e a fatura para zerar o problema é alta. De acordo com a consultoria McKinsey, para prover água a toda a população urbana do mundo até 2025, serão necessários investimentos de 480 bilhões de dólares em infraestrutura de tratamento e distribuição, o equivalente ao PIB da Noruega. Parece muito, mas o preço de não fornecer água de qualidade pode ser muito maior. No México e na Índia, o número de protestos provocados pela escassez tem aumentado. A crescente tensão ficou clara no último verão indiano, que bateu recorde de calor. O pico da demanda inflacionou os preços cobrados pela máfia do caminhão-pipa e elevou a pressão sobre os lençóis freáticos. Embora seja proibido, os proprietários de terra da região abrem poços em seus quintais para sugar água do subsolo e vendê-la ilegalmente. Cada 1 000 litros — o consumo de uma família de quatro pes soas durante cinco dias — custa o equivalente a até 40 reais, valor alto para o padrão das famílias mais pobres nas grandes cidades. A cada nova onda de calor, os agricultores perfuram mais fundo, os donos dos caminhões-pipa cobram mais caro e a população urbana fica mais revoltada. O fenômeno ganhou as manchetes da mídia internacional neste ano. Se os investimentos necessários não forem feitos, a tendência é que esse se transforme no novo padrão. Infelizmente, não apenas na Índia
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Hoje, mais da metade dos habitantes do planeta já vive nas cidades. Esse número deverá aumentar para quase 60% da população mundial em 2025, com um agravante. Levando- se em conta o crescimento populacional nos centros urbanos mais a migração vinda do campo, as metrópoles receberão 1 bilhão de novos habitantes nos próximos 13 anos. Quase todas as cidades em que o consumo de água deve crescer acentuadamente ficam em países emergentes. "Não vamos solucionar esse problema sem gastar tempo, vontade política e muito dinheiro", diz Rob McDonald, pesquisador da ONG americana The Nature Conservancy. Atualmente, pelas contas de pesquisadores da Universidade da Cidade de Nova York, quase 900 milhões de pessoas vivem em cidades onde falta água em algum momento do ano. Ou seja, durante pelo menos um mês do ano, a disponibilidade é inferior a 100 litros por pessoa por dia.
Escassez pelo mundo.
Para parte dos ambientalistas, o crescimento das cidades, apesar dos problemas que gera, é a solução. Simplesmente porque é mais barato construir infraestrutura para áreas com grandes densidades. Essa é a teoria. Na prática, países emergentes e pobres não têm conseguido prover os serviços básicos nem em suas maiores cidades. Para piorar a situação, cerca de 80% da demanda futura deve vir da parte do globo onde hoje a qualidade e a distribuição da água transitam entre o ruim e o muito ruim. Na Cidade do México, por exemplo, a oferta de água nos dias mais secos é reduzida a 2 litros por habitante. Se nada for feito, essa situação de calamidade vai se espalhar. Estima-se que, até 2050, 3 bilhões de pessoas enfrentarão algum tipo de privação hídrica nas cidades.
No Brasil, onde estão 12% da água doce mundial, menos da metade dos 5 565 municípios tem abastecimento considerado satisfatório. Para não arriscar ficar sem água nos próximos três anos, a outra metade precisa investir na ampliação dos sistemas de captação ou encontrar novos mananciais. "Há um descompasso entre o crescimento urbano, com a expansão das favelas e dos bairros de periferia, e a velocidade com que se constrói infraestrutura de tratamento de água e saneamento", afirma Glauco Kimura de Freitas, coordenador do programa de água doce da ONG WWF Brasil. Se a questão do abastecimento de água se resumisse à quantidade, já seria gravíssima. Mas somam-se as dificuldades relacionadas à qualidade. Na China, por exemplo, o Ministério dos Recursos Hídricos já admite que mais de 70% de toda a água da superfície do país — e 74% da subterrânea — está poluída. Ou seja, é preciso ser tratada para ser consumida. "É triste perceber que problemas de poluição semelhantes aos que assolam as cidades chinesas, onde há contaminação por mercúrio, já aconteceram em outros lugares antes e são extremamente conhecidos. Mesmo assim, não foram evitados", diz Darrin Magee, diretor do Centro de Estudos Ambientais Asiáticos da faculdade Hobart and William Smith, de Nova York.
A inabilidade dos gestores públicos em lidar com a questão da água é generalizada, e a fatura para zerar o problema é alta. De acordo com a consultoria McKinsey, para prover água a toda a população urbana do mundo até 2025, serão necessários investimentos de 480 bilhões de dólares em infraestrutura de tratamento e distribuição, o equivalente ao PIB da Noruega. Parece muito, mas o preço de não fornecer água de qualidade pode ser muito maior. No México e na Índia, o número de protestos provocados pela escassez tem aumentado. A crescente tensão ficou clara no último verão indiano, que bateu recorde de calor. O pico da demanda inflacionou os preços cobrados pela máfia do caminhão-pipa e elevou a pressão sobre os lençóis freáticos. Embora seja proibido, os proprietários de terra da região abrem poços em seus quintais para sugar água do subsolo e vendê-la ilegalmente. Cada 1 000 litros — o consumo de uma família de quatro pes soas durante cinco dias — custa o equivalente a até 40 reais, valor alto para o padrão das famílias mais pobres nas grandes cidades. A cada nova onda de calor, os agricultores perfuram mais fundo, os donos dos caminhões-pipa cobram mais caro e a população urbana fica mais revoltada. O fenômeno ganhou as manchetes da mídia internacional neste ano. Se os investimentos necessários não forem feitos, a tendência é que esse se transforme no novo padrão. Infelizmente, não apenas na Índia
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